quarta-feira, 31 de março de 2010

De pés ao vento e dedo esticado para a estrada

O mais interessante desta viagem sao sem duvidas as pessoas que vamos encontrando pelo caminho...
Até agora, retirando o facto de nao conseguirmos postar com tanta frequencia como nos gostaria, tudo flui como o vento e a nossa estrelinha tem brilhado sempre!
Entrámos na carretera austral, que atravessa os Andes chilenos à boleia.
Depois de uma noite em Coyaique, onde usufruimos de tempo de qualidade e um belo salmao grelhado para o jantar na companhia de uns amigos franceses que haviamos conhecido em El chaltén, seguimos de dedo estendido pela famosa carretera até Puerto Cisnes. Esta era a nossa meta!
A nossa primeira boleia foi num camiao com dois rapazes de 20 e pouco anos eram cerca de 13h da tarde(sim, porque há que dormir bem!!:D )...dai até uma vila apanhámos o primeiro bus que nos apareceu na estrada onde poucos carros passaram e dessa vila num instante apanhámos novamente boleia até um cruzamento uns 20km mais á frente. Ai pudémos disfrutar de tempo de espera de grande qualidade, jogando aos nossos jogos de infancia e apreciando a bonita paisagens que aquela regiao esconde e que nos abençoou com uns pinguitos de chuva...ainda tememos ficar naquela zona de ninguém por um tempo, mas eis senao quando que nos apareceu um sr com um jipe, já com dois mochileiros e suas grandes mochilas.
Nunca eu pensei que houvésse este tipo de generosidade nem que alguém parásse para dar boleia quando já tinha duas pessoas á boleia no seu carro, mas o sr tantas voltas deu e tanto se empurraram as mochilas que conseguimos estar os 5, as nossas mochilas e as dos outros dois, mais as malas do sr.(algumas ainda tiveram de ir para o tecto!) e o didgeridoo dentro do carro! Sabem aquela anedota de quantas pessoas cabem num mini?...foi quase isso!! Encaixadas e de movimentos limitados, mas bem contentes, lá seguimos até a outra paragem!
Os rapazitos que viéram connosco eram israelitas (que por aqui há aos molhos!!), e diziam que já andávam carretera à dois dias, e que demoraram cerca de um dia a fazer o percurso, que nós, mochileiras cheias de vento e bem dormidas, fizémos em apenas poucas horas de estrada! Um orgulho!!
A partir daqui já ninguém nos agarrou! Mesmo debaixo de chuva!!
Num instante quase assutador logo outro sr. parou tb para nos dar boleia até à pequena vila pescatória de Puerto Cisnes onde eu e a Inês tinhamos decidido dormir! Parecia que ia ser complicado ir até lá, pois ficava fora da carretera, mas nao é que este sr ia precisamente para lá!??! ah pois é!!!! E assim foi que fizémos uma boa parte da carretera mais famosa do Chile à boleia! Também queriam, nao?!?! Pois digo-vos amigos, que valeu a pena!
De Puerto Cisnes, seguimos de barco para a ilha de Chiloé, terra de duentes e bruxos e seres mítico como o Chauco(!?)...
Nao vimos baleias na viagem de barco, mas esta foi até ao momento a nossa maior travessia náutica, e posso garantir que muitos filmes se viram...nada como ver "A vida é bela" em espanhol!!! ui ui!!
A primeira cidade de Chiloé, Quéllon, terra de gente "borracha" nao nos levou ao altar...retirando um Sr. de cerca de 50 anos que nos falou da sua experiência a fuzilar pessoas no tempo do Pinochet, enquanto jantávamos na companhia de um Suiço que encontrámos no barco...foi mais uma noite que nao esquecerei...uma historia destas contada na primeira pessoa, com um sotaque chileno fechadíssimo, e que para entender tinhamos de estar com os olhos e ouvidos totalmente direccionados para aquela personagem de olhos enrugados onde algumas lágrimas nao conseguiram deixar de cair...
No dia seguinte seguimos à boleia novamente até Chonchi...pelo meio acabámos por ser transportadas por Jaime!! Este grandioso Sr. além de ser de uma simpatia extrema, ainda nos levou a dar uma volta a praia de Cucao, do outro lado da ilha, e depois ainda nos ofereceu comida e estadia na sua cabana junto ao mar, entre Chonchi e Castro!
Na verdade, nao vimos muito de Chonchi, e em Castro vimos bastante de carro porque ele tb nao nos largou enquanto nao teve a certeza de que estávamos orientadas na cidade...mas o mais maravilhoso, foi poder usufruir da sua cabaninha e do conforto de estar numa casa, com uma vista serena e agradável e em tao boa companhia! Foi um bálsamo para os nossos corpinhos e muito revigorante para as nossas almas de viajantes! Apenas uma noite pareceu-nos uma semana! Foi muito muito bom!
Bem, e dai seguimos para Ancud de bus, que na verdade, para além de uma chuvada em que parecemos pintos, a pousada de fabulosa Sra. Jenny, e uma excelente exposiçao sobre as igrejas de madeira da ilha e a sua reabilitaçao, nao há muito mais para contar.
O nosso erro maior, foi termos parado em Puerto Montt ao sair da ilha, pois depois de tao bela estadia em Chiloé, a cidade cinzenta e agitada de Puerto Montt fez-nos sentir deprimidas ... e assim foi que seguimos logo no dia seguinte para Villarica...ui...e há muito para contar sobre esta vila...tanto que vai ter de ficar para o próximo post!!! :P

Beijoes grandes a todos! Muitas saudades!!!

segunda-feira, 15 de março de 2010

Nao há céu como o daqui

Ja estamos de volta ao Chile, mais precisamente em Chile Chico (que se traduz por "pequeno chile").
Hoje apanhámos as nossas primeiras boleias e tudo correu tranquilamente. Amanha vamos "atacar" a Carretera Austral com o nosso polegar. É uma bela maneira de conhecer pessoas da zona e poupar alguns trocos.
A Claudia esqueceu-se de mencionar que em El Chalten iniciámos a caminhada para o Fitz Roy ainda de madrugada escura. Foi lindo ver o nascer do sol no caminho e assistir à mudança de cor das paredes do grande cerro. Primeiro vermelho, depois laranja, amarelo... e por fim branco e cinza.
Antes da partirmos de El Chalten, ainda pudémos disfrutar de um espectáculo de doma de cavalos (uma festa anual tradicional) e o Filme "Kamchatka", integrado num ciclo sobre a memória do último golpe de Estado no país, em 76. É um filme muito bonito e tem uma banda sonora igualmente bonita: o poema "Palavras para Julia", que conhecia na voz do Paco Ibañez, agora também imortalizado pela Liliana Herrera. No final estivémos à conversa com um antigo preso político. Tal como ele se descreve, um protagonista da História. A voz de todos aqueles que desapareceram... É enriquecedor ouvir os discursos na primeira pessoa.

sexta-feira, 12 de março de 2010

El Chaltén e o Fitz Roy!!

Tenho apenas 9 min para escrever qualquer coisinha para os nossos fiéis seguidores!! A internet no nosso belíssimo albergue de aldeia nao existe e a conecçao neste ponto de internet "a pagantes" tb nao é nada de jeito devido ao mau tempo que hoje se faz sentir aqui pelas montanhas!!

Estamos em El Chaltén, juntinho ao Fitz Roy. Belíssimo e ao mesmo tempo muito semelhante ás torres de Torres del Paine...nao fosse esta montanha considerada as Torres del Paine Argentinas!

Saímos de Ushuaia e seguimos para EL Calafate e de lá, com os nossos amiguitos brasileiros Pedro e Werner, que já tinhamos conhecido em Ushuaia (um dia quando conseguirmos net para actualizar as fotos poderao saber melhor de quem se trata!), rumámos para estas belas terras, onde ontem fizémos a nossa caminhada rumo ao cume! Estamo-nos a tornar excelentes caminhantes, pois nao foi nada que se comparásse ao esforço de Torres del Paine! Agora já ninguém nos apanha!!! Venham Bariloches, Acongáguas e outros mais que nós estamos lá!!! :D

De resto as novidades nao sao muitas! Temos tido sempre muito sol, embora hoje chova (primeira vez desde que começámos a viagem), e estamos já a programar a nossa subida para Chiloé! Iremos primeiro de bus e depois, como aventureiras que somos, estamos a ponderar hitchiking através da carretera austral nas montanhas do chile!!! Prometemos contar como foi quando conseguirmos um local com net... que pode ser daqui a algum tempo, pois já nos disseram que poderia demorar uns bons dias até chegar ao fim do percurso!!! Desejem-nos sorte!!

Entretanto vimos numa televisao por onde passámos que houve outra réplica na zona de Concepción, no Chile, mas por aqui mais uma vez a terra têm-se mantido estável! Por isso don´t worry!!

Beeeemmm...já estou a gastar mais um round de 15min de net, pois os 9 min iniciais, sem saber bem como foi possível, voaram e agora tenho apenas mais 2 min!! Como nao quero ter de pagar mais, vou aproveitar e...

...despeço-me com amizade...até ao próximo post!!

terça-feira, 9 de março de 2010

Fomos ao fim do mundo e ja voltamos

Apos nova ausencia prolongada, ca estamos de novo a dar noticias!
Depois de alguns dias de tensao devido a reprogramacao dos voos das duas Anas, voltamos a calmaria de El Calafate para vir buscar a metade do conteudo da nossa bagagem que ca tinhamos deixado (e perguntamo-nos agora como vamos conseguir enfiar tudo dentro da mochila novamente... havemos de conseguir!).
Neste momento as Anas ja devem estar quase quase de regresso a casa.
Entretanto ainda fomos todas a Ushuaia. Gostei de conhecer a famosa cidade mais autral do continente americano. E uma cidade nada perfeitinha e para turista ver. Pelo contrario. E feia e desarranjada. E sobretudo uma cidade vivida. A rua principal esta sempre cheia de gente, principalmente de muita juventude cosmopolita. O porto com os grandes navios que rumam a Antarctida e o canal Beagle emoldurado por montanhas dao-lhe um ar simpatico.
Eu e a Claudia ja compramos livros sobre a passagem de Darwin pela patagonia pois cada vez ficamos mais maravilhadas com as descricoes que ele fez da natureza e das gentes que aqui habitavam. Na altura ele ficou bastante mal impressionado com os indios destas paragens :)
Em Ushuaia visitamos o Parque Nacional da Terra do Fogo. Uma paisagem completamente diferente da de Torres del Paine, mas igualmente fascinante. Acompanhadas pelas nossas companheiras biologas, ficamos muito mais atentas a fauna envolvente. Nao imaginam como ficamos histericas quando finalmente conseguimos observar pica-paus bem de perto! Eram enormes. E com a cabeca vermelha. Tinhamos passado as ultimas horas de caminhada sempre alerta, a procurar por entre as arvores esburacadas pelos seus bicos. Finalmente eles ali estavam a dar-nos um ar da sua graca :) Infelizmente nao tivemos a mesma sorte com os castores. Esses nao lhes pusemos a vista em cima. No entanto ainda conseguimos observar a forma engenhosa como constroem diques e pontes.
Durante esses dias que estivemos em Ushuaia, pernoitamos num Hostal bem ao estilo Kusturica, repleto de israelitas. A maior parte dos jovens deste pais parte para uma grande viagem de varios meses, apos terminar o servico militar. Pelos vistos muitos deles escolhem a America Latina como destino.
Numa das noites decidimos sair um pouco da rotina pe descalco e fomos, imagine-se, jantar fora o belo do cordeiro assado. Juntamo-nos a brasileiros, um americano e um holandes e disfrutamos da afamada carne argentina.
No ultimo dia decidimos passear enquanto a Ana foi ao museu (nos ja tinhamos visitado o museu de Punta Arenas). Qual nao foi a nossa surpresa quando vimos que o filme em cartaz do mini cinema perdido dentro da antiga prisao (agora museu) de Ushuaia, ali bem no fim do mundo era... nada mais nada menos, que a ultima producao do Tim Burton "Alice in Wonderland" acabado de estrear em Portugal. Nao quisemos perder a oportunidade e a noite la fomos. Ainda bem que chegamos com meia hora de antecedencia pois a fila ja era grandota e nao parou de crescer. A plateia estava esgotada e nao ha lugares marcados. Foi uma curiosa experiencia sociologica. Quanto a experiencia cinematografica... ficamos um pouco desiludidas... mas isso agora seria outra longa conversa :p
Aproveito para partilhar ainda convosco que arranjei um optimo entretem para viagens de autocarro que duram mais de 10 horas: comprei novelo de la e agulhas e estou decidida a fazer um cachecol azulao! Tudo gracas ao ponto de tricot que a minha avozinha me ensinou quando era criancinha :) Depois mostro-vos como ficou!
E pronto, aqui ficam mais umas noticias destas duas mochileiras que ja estao bastante ansiosas por seguir para Norte e deixar esta zona turistica, onde toda a gente vai visitar os mesmos parques e lagunas e fazer os mesmos trekkings e encontram-se sempre as mesmas caras nos hostais e autocarros :)

terça-feira, 2 de março de 2010

Terramoto no Chile



As televisões estão constantemente a passar imagens das pessoas em desespero total em várias cidades Chilenas...o mundo está com os olhos postos neste povo e na catástrofe natural que o atingiu...e nós, aqui estamos...

Saímos de Torres del Paine onde estivémos 4 dias incontactáveis e fomos bombardeadas por mensagens da família e amigos que queriam saber se estávamos bem... O sismo tinha acontecido na madrugada do dia em que saímos das montanhas e felizmente isso impediu que o pânico das nossas famílias não atingisse proporções maiores por não saberem de nós logo após a noticia se ter espalhado pelo mundo.

Se por um lado é muito bom não termos sido atingidas por nenhum mal, e termos estado a aproveitar a estadia aqui e a ver montanhas, paisagens lindas e glaciares fantásticos onde o condor plana ao sabor do vento, e que ainda ontem, mesmo depois de saber da notícia não hesitámos em ir passear e ver golfinhos e raposas, por outro é extremamente estranho saber que aqui perto há pessoas que sofrem, que se matam por comida e água, que se defendem com armas e que procuram os seus entes queridos no meio de escombros, ou que simplesmente não largam o telefone em busca de noticias dos seus parentes desaparecidos.
Os donos dos hostel em que estamos instaladas têm parentes a dormir no carro por medo de estar em casa e sofrerem uma réplica do terramoto que lhes derrube a casa que até agora resistiu.

Por toda a cidade de Punta Arenas e vêem turistas como baratas tontas a tentar recuperar os vôos de regresso a casa.
A fila de espera em frente à porta da Lan (companhia aérea chilena), responsável por levar muitos turistas a passear por estas terras, dá a volta ao quarteirão e as pessoas acumulam-se desde madrugada para conseguirem entrar! As companhias estão com grandes problemas em encaixar a massa de gente que tinha vôos a passar por Santiago, que agora, por o aeroporto estar a meio gás, conseguem manter os vôos previstos e muito menos encaixar todos nas datas marcadas. Há polícias a distribuir senhas à porta e a tentar controlar as pessoas que tentam furar...dizem as Anas, que hoje foram para lá as 7h (aquilo abria as 10h) que até jornalistas a fotografar havia!! E efectivamente, havia fotos da fila no jornal regional (ainda procurei por elas na foto, mas sem sorte! ;P )

As Anas, nossas companheiras de viagem por 12 dias tinham vôo marcado para hoje, e estão desde ontem numa luta de chamadas via skype e conversas via msn a tentar saber como apanhar um avião que as retire do país sem terem de comprar vôo novo e sem ficarem aqui retidas dias, pois a Lan não lhes dá garantias de que as consegue encaixar num vôo em breve... o vôo era para esta manhã e calcula-se que só dia 10 é que as conseguem levar até Santiago e depois de lá é aguardar que as consigam colocar num vôo para Madrid.

Eu e a Inês, sem previsões de saída e sem problemas de transporte, assistimos a esta luta delas e ás noticias que nos chegam...da minha parte, sinto-me como dentro de uma bolha...

Estamos em terras seguras, longe dos problemas do país, e onde não se houve falar da possibilidade de um sismo, ou de réplicas e muito menos de tsunamis por estarmos longe do mar e não haver actividade tectónica.

A sensação é a de estar num porto de abrigo, e as coisas más estarem a acontecer longe dos meus sentidos e do meu corpo físico. Lá longe há gente morta, pessoas a sofrer e eu só posso imaginar o que isso será...
As imagens que vejo de passagem na tv são fortes e assustadoras, mas distantes...nunca tive de passar por uma situação de sobrevivência e a minha imaginação nunca conseguirá fazer-me sentir a dor que algumas pessoas estarão a sentir...e isso é estranho e faz-me sentir insensível, inútil e impotente! Uma turista em país de caos, a flutuar sobre o problema numa bolha intocável e distante.

O "drama" do vôo de regresso a casa não me atinge directamente porque não preciso de vôo para lado nenhum, e o terror de estar no centro do problema que atinge o país também não me alcança, por ser turista e estar longe da zona afectada, por não ouvir a rádio, por não ter acesso à tv e porque mesmo por jornal ou net, é como se esivésse a ler a noticia a partir de Portugal.

É muito estranha esta sensação, é um estar e não estar, um sentir e ao mesmo tempo estar imune...

...

Entretanto as Anas, parece que conseguiram vôo de regresso a casa...a Ana Almeida dia 10 e a Ana Maria dia 8...vão separadas e via Buenos Aires...afinal a luta delas compensou...

E no hostel fomos convidadas a participar num jantar feito por todos...o prato a ser preparado é o Curanto...

...e a vida contiua, e na verdade temos de saber aproveitar os pequenos momentos desta experiência que está a ser a nossa viagem e ficar contente por termos a sorte de estar em zona segura.